segunda-feira, agosto 13, 2007

236) A tragedia da educacao brasileira: professores desmotivados

Nossa guerra
Cristovam Buarque*
www.blogdocristovam.com.br
Jornal do Commercio, 10/08/2007

Na semana passada, no município catarinense de Joaçaba, uma moça pôs um gravador na minha frente e perguntou: "O que você diria ao pai de um jovem de 16 anos que diz ter decidido ser professor?" Respondi: "Diria que me sentia como se o rapaz estivesse se alistando no Exército em tempos de guerra. O pai tem todo o direito de se assustar com o futuro do filho, mas tem motivos para se orgulhar do seu patriotismo". A pergunta de Santa Catarina se justifica plenamente. Hoje, raros pais ficam felizes com a opção de um filho pelo magistério.

Um mês atrás, em Brasília uma professora da rede pública me disse que o pai deixou de falar com ela, desde quando ela lhe comunicou sua opção pelo magistério. No Brasil, escolher o magistério é um gesto extremo, como alistar-se para ir à guerra.

É triste reconhecer, mas a carreira de professor não oferece um futuro promissor. O jovem que escolhe essa carreira provavelmente terá um salário baixo, trabalhará em escolas fisicamente degradadas, não contará com modernos equipamentos, enfrentará turmas desmotivadas e estará sujeito a atos de violência. Entretanto, são esses os profissionais que enfrentarão a guerra da construção do futuro do Brasil. São soldados do futuro, são patriotas.

A razão óbvia para essa posição está nas péssimas condições de trabalho, inclusive salariais. Por trás, há razões mais profundas. Quando um jovem escolhe a carreira de médico ou engenheiro, o pai vê três vantagens: um futuro promissor, uma boa remuneração e o orgulho de filho que ajuda a construir o País. É um soldado do futuro e bem pago. Na opção pelo magistério, o pai não tem o sentimento de construção do futuro, do respeito social pelo filho, e sabe dos baixos salários que ele provavelmente terá.

Ainda mais do que o salário, o que pesa na frustração dos pais é a falta de reconhecimento, como se esta fosse uma profissão menor. Mas a falta de reconhecimento decorre principalmente do baixo salário. Cria! -se um círculo vicioso: não é uma carreira de sucesso porq ue os salários são baixos, e não há reconhecimento. O professor se sente diminuído e mais diminuído fica.

Os servidores do Banco Central fizeram uma greve, no mesmo período que professores em diversos estados. Em média, o simples aumento pleiteado pelos funcionários do Banco Central equivalia a quase duas vezes o salário mensal dos professores. Porque, na visão do Brasil, a educação é secundária. Não se percebe que o futuro econômico nacional está no capital-conhecimento, e que a quebra da desigualdade social só virá com o acesso de todos a uma escola com a mesma qualidade.

Quando a falha de infra-estrutura aérea ficou evidente, o governo decidiu construir novas pistas, novos aeroportos, trens especiais para levar os passageiros. Bilhões de reais foram rapidamente prometidos. Isso porque os aviões precisam decolar. Mas não há recursos para fazer o País decolar com a construção dos aeroportos do futuro: as escolas.

A maior dificuldade para tirar o Brasil do impasse que vive sua sociedade é convencer a opinião pública de que a escola é importante e os professores são os construtores do futuro.

Quando isso acontecer, no momento em que nascer uma criança, seu pai vai colocá-la nos braços, olhará seu rostinho e dirá: "Quando crescer, vai ser professor". E pensará: "vai ter uma bela carreira, um bom futuro e ajudará o Brasil a vencer nossa guerra contra a pobreza, o atraso, a desigualdade". Nesse dia, a pergunta feita na semana passada perderá o sentido.


* Professor da Universidade de Brasília, Senador pelo PDT / DF.

4 comentários:

Anônimo disse...

Doutor Paulo Roberto,
sou uma vestibulanda de 17 anos e simplismente adorei seu texto!
você escreveu tudo o que eu fico me perguntando ao ver os jornais diários que só sabem falar deste acidente de avião e deixam a educação das crianças e os dignos professores em último lugar em grau de importância.
Também fico indignada com a questão da população se manifestar com tal tamanho com este desastre de avião e não se importar com o número de mortes que ocorrem em nossas rodovias federais, li que mais de 600 pessoas já morreram nelas em 6 meses, mas não, ninguém dá bola, afinal, morrer em estradas se tornou tão corriqueiro, já acidente de avião é raro, e quando ocorre mata muitas pessoas ao mesmo tempo.
um grande abraço!

Paulo Roberto de Almeida disse...

Gabriela,
Agradeço seus comentários, mas nao me cabe mérito pelos argumentos aqui exibidos, uma vez que eles não me pertencem, e sim ao Senador Cristovam Buarque. Mas eu concordo integralmente com eles, e esta foi a razão de ter feita a transcrição do artigo, expressamente citado, em meu blog.
A questão da educação e a das estradas federais (objeto de outro post neste mesmo blog) fazem parte dessas tragédias brasileiras quase ignoradas, mas que devemos sempre recordar, para tornar o país um pouco melhor do que atualmente.

Anônimo disse...

A CONTRA-CULTURA ESCOLAR
Uma breve reflexão sobre a situação educacional brasileira

Meu nome é Carlos Djonis Carrocci, sou Professor de Ensino Fundamental do nível I, atualmente não estou exercendo a profissão por estar me dedicando aum ofício religioso, mas desempenhei esta função durante 12 anos da minha vida tanto na rede pública estadual quanto na rede pública municipal. Na maior parte da minha docência trabalhei em projetos de reorganização escolar (Classes de Aceleração), e em projetos que atendiam crianças e adolescentes com dificuldades de acompanha a série respectiva à sua idade (PIC - Programa de Inclusão no Ciclo). Pela minha pequena experiência no atendimento de alunos provenientes de classes populare e com um perfil muito carente, chego a conclusão que o Senador Cristovão Buarque tem razão quando diz que a Educação não recebe o devido tratamento, porém, não concordo que esta tem sido encarada secundariamente, talvez esteja sendo considerada em terceiro, quarto ou quinto e último lugar. O problema é que se os políticos quisessem mesmo fazer um movimento sólido e coerente para a melhoria da Educação Brasileira teríam que, na minha opinião, começar por uma mudança de mentalidade e a partir daí criar um sentimento nacional de resgate dos valores da Educação e de seu grau de importância dentro da experiência humana. Assim, o "capital-conhecimento", como coloca o Senador, seria realmente valorizado. Na minha prática docente com esses alunos que citei acima, identifiquei que muitos deles só precisavam ser motivados da maneira certa, melhor dizendo, precisavam ser criadas contingências adequadas para que os próprios educandos se motivassem mutuamente. E posso afirmar que o sucesso da qualquer processo de ensino-aprendizagem só terá êxito se o mesmo perpassar pelo íntimo de cada um. Não quero somente "poetizar" a questão motivacional, mas com certeza, toda a transformação de uma sociedade só será possível se primeiro ela ocorrer dentro de nós e isto aliado a vontade política e geração de investimentos em todas as áreas que envolvam o processo educacional. Como professor também reconheço que grande parte do problema da falta de qualidade na Educação podería ser resolvido se melhorássemos a formação desse profissional, a mudança deve atingir os bancos das Universidades e também devem atingir aqueles que trabalham na gestão dos recursos e do próprio sistema escolar, pois, talvez sejam estas instâncias as mais afastadas da realidade escolar. Sem dúvida há muito que se fazer, mas creio que, como diz um provérbio chinês, uma grande caminhada se começa pelo primeiro passo. acredito que alguns passos têm sido dados, só precisamos sincronizá-los e sistematizá-los de maneira que alcancemos eficiência e eficácia no aprimoramento de todo o processo educacional brasileiro, aliás, se compararmos os investimentos de países que têm obtido um melhor desempenho nas avaliações internacionais, verificaremos que pelo que gastamos com a Educação somos vencedores, somos verdadeiramente heróis. Agradeço a oportunidade dessa publicação e me coloco à disposição para debatermos construtivamente com quem quer que seja as questões que se referem à Educação em nosso país. Meu e-mail: procdc@gmail.com. Um grande abraço ao PRA e aos leitores e leitoras desse blog!!!

Unknown disse...

Inicialmente, quero parabenizá-lo pela iniciativa deste espaço.
Sou Gardenia Salazar, Pedagoga e Supervisora Escolar, numa escola da rede pública municipal, em Codó, um,a cidade do interior do Maranhão, mas também já atuei na rede estadualtambém, inclusive como Professora. Assim já estive nos dois lados dessa realidade que é a educação, no entanto, nunca havia me deparado com um quadro tão triste quanto tenho visto: alunos e professores sem a menor motivação. Fico estarrecida como que governos investem tanto e não conseguem reverter a situação? Quando que irão realmente querer mudar essa disparidade social?
Sinto-me as vezes como estivesse nadando contra a maré ao tentar manter meus professores motivados e alunos interessados, estamos desacreditados, nada do que façamos surtirá efeitos.