Reproduzo abaixo uma representação a ser encaminhada à Promotoria de Justiça do DF (12.03.2008).
Subscrevo inteiramente. PRA
Excelentíssimos Senhores Promotores de Justiça das Promotorias da Educação, de Defesa do Consumidor, e de Defesa da Infância e da Juventude
Miguel Francisco Urbano Nagib, brasileiro, casado, advogado, inscrito na OAB-DF sob o nº 17.610, CPF nº 029.861.568-19 (doc. 01), residente e domiciliado em Brasília-DF, na SHIN QI 10, conjunto 11, casa 12, CEP 71.525-110;
vêm, respeitosamente, com fundamento nos arts. 5º, XXIV, ‘a’, da Constituição Federal, e 6º da Lei nº 7.347/85, expor e, ao final, requerer o que segue:
OS FATOS
1. Nos últimos 30 anos, um número cada vez maior de professores e autores de livros didáticos, adeptos de uma corrente pedagógica que defende a instrumentalização do ensino para fins político-ideológicos, vem-se utilizando de suas aulas e de suas obras para doutrinar ideologicamente os estudantes, com vistas na formação e na propagação de uma mentalidade social favorável aos partidos e organizações de esquerda.
2. A prática acha-se hoje difundida por todo o território nacional, tanto nas escolas públicas, como nas particulares, da pré-escola à universidade, intensificando-se a partir das últimas séries do ensino fundamental, à medida que os estudantes se aproximam da maioridade eleitoral.
3. Dizem esses professores e autores que se trata de despertar nos estudantes o que chamam de “consciência crítica”. Na prática, todavia, a “visão crítica” por eles oferecida aos alunos já vem pronta, resumindo-se a uma crítica marxista vulgar da sociedade capitalista e dos valores da civilização judaico-cristã, destinada a produzir nos estudantes – jovens imaturos e inexperientes – uma afinidade, nem sempre consciente, com o discurso ideológico das correntes e partidos de esquerda.
4. O dogmatismo marxista domina, hoje, todo o sistema de ensino. As faculdades de educação, sociologia, história e geografia estão impregnadas de uma ideologia igualitária radical que detesta o capitalismo e demoniza tudo o que, direta ou indiretamente, a ele se vincula: os EUA, o estado de Israel, a Igreja Católica, a colonização européia, a burguesia, os empresários, a propriedade privada, o agro-business, os militares, os meios de comunicação, as multinacionais, a globalização, a Coca-Cola, o McDonalds, etc.
5. Graças aos preconceitos ideológicos e à visão tendenciosa desses professores e autores, está cada dia mais difícil encontrar um jovem brasileiro, na faixa dos 15 aos 25 anos, que não alimente uma aversão irracional em relação ao regime capitalista e uma atração ainda mais irracional em relação à utopia socialista; e que não esteja pronto a entregar os destinos da nação a políticos que pensam (ou fingem que pensam) como ele.
6. A extensão e a gravidade do problema podem ser avaliadas a partir das reportagens, artigos e depoimentos constantes da relação anexa (doc. ).
AS ORIGENS DO PROBLEMA
7. Os fatos comprovados pelas reportagens, artigos e depoimentos anexados a esta representação demonstram uma realidade conhecida por experiência direta da imensa maioria dos estudantes e ex-estudantes que passaram pelo ensino fundamental, médio ou superior nos últimos 20 ou 30 anos. É impossível ler esses textos sem que nos venha à lembrança a imagem de vários professores que tivemos e de livros didáticos pelos quais estudamos, especialmente nas disciplinas de História e Geografia.
8. Pode-se, pois, afirmar que se trata de fatos notórios, admitidos até mesmo pelos promotores da doutrinação ideológica em sala de aula, que se justificam com o argumento de que a “educação é um ato político” e de que não existe neutralidade ou objetividade científica.
9. Essas e outras justificativas podem ser encontradas nas obras dos ideólogos e educadores que forjaram a mentalidade hoje dominante nos meios acadêmicos, especialmente na área das ciências sociais. É inegável, com efeito, a relação entre o problema da doutrinação ideológica e os mecanismos e instituições responsáveis pela formação dos professores.
10. Na reportagem de capa da revista ÉPOCA, mencionada no item 17 da relação anexa, encontramos a seguinte referência a esse importante aspecto do problema:
A visão maniqueísta da História pode ser encontrada já no curso de Pedagogia. Para mostrar isso, Bráulio Porto de Matos, da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, compara os manuais de didática mais usados pelos professores na década de 60 com o livro mais popular de hoje. O manual de Amaral Fontoura, usado até os anos 70, era principalmente técnico: fazia críticas ao processo de ensino. A obra mais atual, de Carlos Libâneo, no entanto, já em suas primeiras páginas fala sobre a perversidade do capitalismo: “As relações sociais do capitalismo são, assim, fortemente marcadas pela divisão da sociedade em classes, onde capitalistas e trabalhadores ocupam lugares opostos e antagônicos no processo de produção. A classe proprietária dos meios de produção retira seus lucros da exploração do trabalho da classe trabalhadora”. De certa forma, a esquerdização dos professores no Brasil foi um reflexo do período de ditadura militar no país, nos anos 70. “Os professores empreenderam uma grande luta de retorno à democracia”, diz Célio Cunha, assessor de educação da Unesco no Brasil. “Estamos em uma fase de transição. Naturalmente estes livros refletem a realidade recente do país”, diz. Para ele é importante manter o direito de livre escolha do professor. “É a continuidade desse processo que nos colocará, daqui a alguns anos, em um ponto de equilíbrio.” Mas a transição talvez esteja demorando demais em um país que abandonou a ditadura há 20 anos. E ela não justifica o maniqueísmo assumido pelos livros.” (p. 68 – doc. )
11. Segundo o professor Bráulio Tarcísio Porto de Matos, citado na reportagem, é possível identificar três tendências básicas nas quatro últimas décadas, relativamente aos cursos de pedagogia :
1) ANOS 60 – A primeira metade da década de 60 constitui uma espécie de ante-sala da doutrinação ideológica nos cursos de pedagogia. Diga-se ante-sala porque o movimento de doutrinação ideológica da educação nesse período foi gestado fora das faculdades de educação, e fortemente assimilado pelos cursos de pedagogia na década seguinte. O principal protagonista desse movimento foi, sem dúvida alguma, Paulo Freire. Patrocinado pelo governador Miguel Arraes, Paulo Freire desenvolveu um método de alfabetização que se propunha alfabetizar adultos em quarenta dias. O segredo do método estaria em assegurar a participação ativa do educando no processo de alfabetização por meio de um diálogo crítico sobre as condições de vida desses educandos e a busca de “palavras geradoras” necessárias para expressar esse sofrimento (“latifúndio”, “patrão”, “enxada”, etc...). A alfabetização, nesse caso, equivaleria a uma “tomada de consciência” sobre a exploração do homem pelo homem, dos “oprimidos” pelos “opressores”, do “povo” pelas “elites”. Dada a simplicidade desse maniqueísmo sociológico, a pedagogia de Paulo Freire foi rapidamente assimilada por variadas forças políticas de esquerda (governos populistas, esquerda católica, seitas marxistas, etc.), primeiramente fora das faculdades de educação, depois, dentro delas.
2) ANOS 70 – Observamos a existência de uma tensão entre duas teses concorrentes, uma “entusiasta” e outra “crítica” da educação escolar. A primeira tese foi elaborada por economistas de orientação liberal e denominada “Teoria do Capital Humano” (Schultz, Friedman, etc.). Ela afirma que educação não é consumo, mas investimento, e fator fundamental de desenvolvimento econômico (em verdade, ela explica por que certos países conseguiram se desenvolver fortemente, como o Japão, mesmo não dispondo de fatores até então considerados indispensáveis para o desenvolvimento, como disponibilidade de mão-de-obra, recursos naturais e capital físico). O economista Cláudio de Moura Castro, por exemplo, foi um dos primeiros pesquisadores brasileiros a divulgar essas descobertas em nosso país. Pode-se dizer que os governos foram paulatinamente adotando com maior ou menor determinação essa tese. Paralela ou interativamente à difusão da pedagogia “libertadora” de Paulo Freire, desenvolveu-se no âmbito das próprias faculdades de educação do país a tese “crítica” da educação formal. Ela foi elabora por sociólogos de orientação marxista e tem sido denominada “Teoria da reprodução” (Gramsci, Althusser, Bourdieu, etc.). Ela afirma que a função da escola é treinar mão de obra para os capitalistas e legitimar esse sistema no plano dos valores (reproduzir a ideologia dominante). No âmbito dos cursos de pedagogia, a tensão entre essas teses concorrentes não era simétrica. Via de regra, os pedagogos tomaram conhecimento da teoria do capital humano através da crítica de esquerda a essa teoria. Uma possível explicação para isso é que os professores dos cursos de pedagogia não tinham um treino mínimo em estatística para ler diretamente os teóricos do capital humano. Em todo caso, o fato é que a nos anos 70 a doutrinação de esquerda é parcial.
3) ANOS 80 – Observa-se que o esquerdismo, mais ou menos mitigado, torna-se hegemônico nos cursos de pedagogia. O avanço da pós-graduação na área contribuiu para isso. A Universidade de Campinas (UNICAMP), particularmente devido ao trabalho desenvolvido por Dermeval Saviani, por exemplo, tornou-se um pólo irradiador do marxismo na educação. Uma observação interessante a fazer aqui é que o regime militar não censurou ideologicamente os cursos de ciências humanas no Brasil. O marxismo foi ensinado nos cursos de sociologia, história, pedagogia sem restrições. No caso da Universidade de Brasília, por exemplo, um dos raros livros marxistas inexistente na Biblioteca Central da universidade era o manual de guerrilha de Che Guevara. No mais, o acesso à literatura marxista era livre e os professores usaram e abusaram dessa liberdade. Foi nesse período, e no âmbito da pós-graduação, que surgiram algumas análises “críticas” do livro didático, destinadas a provar que tais livros estão eivados de “ideologia burguesa”. O exemplo mais consagrado dessa tendência foi “As belas mentiras”, de Maria de Lourdes Chagas Deiró Nosela (São Paulo, Cortez, 1979). Um exame mais imparcial dessa produção, contudo, mostra que um dos defeitos dessas críticas à ideologia do livro didático reside no caráter ad hoc das passagens escolhidas para provar a tese dos autores (confira-se Freitag, Bárbara et alli. “O livro didático em questão”, São Paulo, Cortez, 1997).
4) ANOS 90 – No âmbito dos cursos de pedagogia, o esquerdismo se tornou aquilo de que ele acusa ideologicamente a direita, isto é, “pensamento único”. Decerto ainda encontramos autores de esquerda dizendo coisas do tipo “Os regimes políticos de direita nunca toleraram o ensino de filosofia e das ciências sociais” (Moacir Gadotti) sem serem fustigados pela lógica (afinal, essa tese da intolerância totalitária dos regimes de direita é enunciada à luz do dia nas universidades patrocinadas por esse suposto regime totalitário). De novo, aqui, contradições não atingem a esquerda, que forjou uma lógica dialética para consumo doméstico. Aparentemente, contudo, quando circulamos pelos corredores das faculdades de educação do país tem-se a impressão de que essa tese do pensamento único não tem pé nem cabeça. O “respeito à diversidade” é notável nos corredores. Há cartazes divulgando cursos e debates para todos os gostos: combate ao racismo, multiculturalismo, ecologia, iniciação ao xamamismo, bioética, movimentos sociais, etc... (procurando bem, talvez se possa encontra até alguma coisa referente a didática e metodologias de ensino). Nada parecido, portanto, com algum tipo de “dualismo de poder” leninista-gramsciano. Ocorre que esse “olhar” é desatento. Duas coisas unem efetivamente a essa militância ideológica multifacetada: o relativismo epistemológico-axiológico e a pregação dogmática do igualitarismo”.
A NATUREZA ÉTICO-JURÍDICA DO PROBLEMA
12. A justificativa-padrão utilizada pelos promotores da doutrinação ideológica nas escolas é a de que “não existe neutralidade”, já que “todo mundo tem um lado”. Para os professores e autores militantes, isto resolve o problema, pois, se não existe neutralidade, cada um que cuide de “puxar a sardinha” – isto é, o aluno indefeso – para a sua própria “brasa ideológica”.
13. A dose de má-fé embutida nesse raciocínio é extraordinária. O fato de o conhecimento ser vulnerável à distorção ideológica – o que é uma realidade inegável sobretudo no campo das ciências sociais – deveria servir de alerta para que os educadores adotassem as precauções metodológicas necessárias para reduzir a margem de contaminação. Em vez disso, a militância o utiliza, cinicamente, como salvo-conduto para a doutrinação.
14. Esses educadores aprenderam com seus mestres que assim deve ser, pois a dúvida que possa pairar sobre a moralidade dos meios utilizados se dissipa totalmente diante da “sublimidade” do fim perseguido, e esse fim não é outro senão a “construção de uma sociedade mais justa”. Nas palavras do professor José William Vesentini, um dos mais destacados representantes dessa corrente pedagógica, o ensino da Geografia “crítica” – e o mesmo vale para a História “crítica”, a Literatura “crítica”, a Educação Física “crítica”, etc. – “busca principalmente atuar no mundo, engajar-se nas lutas sociais, produzir enfim uma realidade mais justa” .
15. Ora, a afirmação de que o ensino de uma simples disciplina escolar busca “engajar-se nas lutas sociais” e “produzir uma realidade mais justa” não faz nenhum sentido. Para ser compreendida, a frase do professor Vesentini precisa ser interpretada. Na verdade, o que pretendem os “despertadores de consciência crítica” é produzir no estudante a vontade de engajar-se nas lutas sociais e de atuar politicamente em favor daquilo que lhe é apresentado como sendo uma realidade mais justa.
16. O objetivo, portanto, é, declaradamente, “fazer a cabeça” do estudante para que ele tenha determinado comportamento político. Nisso consiste a doutrinação político-ideológica nas escolas.
17. Ou seja: esses professores e autores estão usando o magistério e a autoridade que lhes é conferida pela função que desempenham para promover o aliciamento político-ideológico e partidário de jovens inexperientes e imaturos. E o que é mais grave: sem o conhecimento e o consentimento deles ou de seus pais.
18. Trata-se, a toda evidência, de um desrespeito à liberdade e à dignidade dos alunos. Não há como deixar de identificar na prática da doutrinação político-ideológica em sala de aula e nos livros didáticos uma forma da exploração a que alude o artigo 5º do Estatuto da Criança e do Adolescente, ao estabelecer, verbis:
Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.
19. Com efeito, numa de suas acepções, o substantivo “exploração” significa precisamente “abuso da boa-fé ou da situação especial de alguém” (Houaiss). Ora, a boa-fé de uma criança ou de um adolescente, no que se refere a questões políticas e ideológicas, pode ser presumida em razão de sua imaturidade, falta de conhecimento e inexperiência. É inquestionável, por outro lado, que o estudante, em sala de aula, se encontra numa situação especialíssima, pois, além de ser obrigado a escutar e aprender o conteúdo transmitido por seu professor, ele deve ser capaz de reproduzir esse conteúdo se quiser obter boas notas e ser aprovado. Intelectualmente, portanto, o aluno está submetido, literalmente, à autoridade do seu professor. E o que faz o professor militante? Abusa dessa boa-fé e dessa situação especialíssima para cooptar ideologicamente seus alunos, isto é, para produzir neles a vontade de engajar-se nas lutas sociais e de atuar politicamente em favor daquilo que lhes é apresentado como sendo uma realidade mais justa.
20. Se, como estabelece o art. 15 da Lei 8.069/90, “a criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento”, nenhum professor ou autor de livro didático tem o direito de atuar profissionalmente com o objetivo de “fazer a cabeça” de seus alunos ou leitores. O educador, sobretudo quando se dirige a indivíduos “em processo de desenvolvimento”, como diz a lei, tem obrigação moral e legal de fazer um esforço permanente e sincero para não permitir que suas inclinações, preferências, simpatias e antipatias o afastem do ideal de objetividade científica.
21. Grande parte de nossos atuais educadores, todavia, não se sente moral ou juridicamente obrigada a fazer tal esforço. De tanto escutar e repetir que “a educação é um ato político”, sequer reconhece a ideologização como um mal a ser evitado. “É inevitável”, dizem eles, “todo mundo tem um lado”, “não existe neutralidade”, etc. Ao abandonarem a noção de objetividade científica, perderam também a de honestidade intelectual.
22. A conduta desses profissionais repercute gravemente sobre a relação de consumo existente entre o estudante, na condição de consumidor de serviços educacionais, e o professor, na de preposto do fornecedor desses serviços. Visto que a maior parte do serviço contratado em benefício do aluno é prestado pessoalmente pelo professor, o conflito de interesses se manifesta claramente quando este se aproveita da ocasião oferecida pelo contrato para “fazer a cabeça” dos estudantes.
23. O prejuízo material e moral que essa prática acarreta para o consumidor – um tipo especial de consumidor, pois estamos falando de jovens imaturos, inexperientes e, o que é mais grave, submetidos à autoridade do próprio fornecedor! – não pode ser subestimado. Basta pensar, por um lado, no tempo de aula desperdiçado com o noticiário político, o “blá-blá-blá” ideológico e a propaganda partidária, principalmente em períodos eleitorais – o que compromete o próprio objeto do serviço contratado –; e, por outro, na influência de longo-prazo exercida pelos professores militantes sobre a visão de mundo desses jovens. Bem sabem os doutrinadores que a reavaliação das idéias e convicções adquiridas durante a adolescência exige um investimento intelectual e emocional pesado demais para a maior parte das pessoas, de modo que a adesão a determinado credo ideológico, quando prestada durante essa fase crítica da vida, tende a prolongar-se por vários anos, até ser desmascarada pela realidade – num processo, muitas vezes, lento e doloroso – ou, simplesmente, apagada pelo esquecimento. Sem dúvida nenhuma, boa parte do sofrimento moral e emocional experimentado na passagem da adolescência para a vida adulta poderia ser poupado se não tivéssemos de nos desembaraçar dos preconceitos ideológicos que nos são transmitidos por nossos mestres ativistas. Ao fim e ao cabo, lamentamos: quanto tempo perdido! Quanta energia desperdiçada!
24. Vê-se, portanto, que o problema da doutrinação político-ideológica nas escolas não se esgota – como querem os educadores comprometidos com essa concepção pedagógica – no campo da pedagogia ou da ciência do conhecimento. As implicações jurídicas são patentes e gravíssimas. Pouco importa que a absoluta neutralidade ou a perfeita objetividade científicas sejam inatingíveis. Sempre será possível para o professor ou autor fazer um esforço para alcançá-las. E a mera possibilidade de se fazer tal esforço é suficiente para torná-lo ética e juridicamente obrigatório.
LIBERDADE DE ENSINAR E DE APRENDER
25. O artigo 206 da Constituição Federal estabelece que o ensino será ministrado com base no princípio da liberdade de ensinar e de aprender (inc. II).
26. A doutrinação político-ideológica em sala de aula e nos livros didáticos constitui claro abuso da liberdade de ensinar; abuso que implica o cerceamento da correspondente liberdade de aprender, já que, numa de suas vertentes, essa liberdade compreende o direito do estudante de não ser doutrinado pelo professor – isto é, o direito de conhecer a realidade em todos os seus infinitos matizes, em toda a sua complexidade.
27. Privados dessa visão abrangente da realidade, os estudantes se transformam em massa de manobra dos líderes cujo discurso aprenderam a admirar. Desse modo, o cerceamento da liberdade de aprender por meio da doutrinação ideológica tem como conseqüência, no plano político, o cerceamento da liberdade de escolha do estudante.
28. Logo, não há como deixar de concluir que os professores e autores de livros didáticos estão obrigados a respeitar esse direito fundamental dos estudantes, por força de expressa disposição constitucional. É o que decorre, ademais, do art. 53, II, do Estatuto da Criança e do Adolescente:
Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:
II - direito de ser respeitado por seus educadores;
29. Partindo dessa compreensão do problema, o site www.escolasempartido.org, já mencionado, elaborou a seguinte relação de deveres do professor:
- O professor não abusará da inexperiência, da falta de conhecimento ou da imaturidade dos alunos, com o objetivo de cooptá-los para esta ou aquela corrente político-ideológica.
- O professor não adotará livros didáticos que tenham esse objetivo.
- O professor não favorecerá nem prejudicará os alunos em razão de suas convicções políticas, ideológicas, religiosas, ou da falta delas.
- O professor não fará propaganda político-partidária em sala de aula.
- O professor não incitará seus alunos a participar de manifestações, atos públicos e passeatas.
- Ao tratar de questões políticas, sócio-culturais e econômicas, o professor apresentará aos alunos, de forma justa – isto é, com a mesma profundidade e seriedade –, as principais versões, teorias, opiniões e perspectivas concorrentes a respeito.
- O professor deve conhecer os argumentos, teorias e pontos de vista de que discorda tão bem quanto aqueles em que acredita, a fim de poder apresentá-los como o faria se fosse seu defensor.
- O professor não promoverá em sala de aula debates preordenados a corroborar a "verdade" ou a "superioridade" de determinada corrente política ou ideológica.
- O professor não criará em sala de aula uma atmosfera de intimidação capaz de desencorajar a manifestação de pontos de vista discordantes dos seus, nem permitirá que tal atmosfera seja criada pela ação de alunos sectários.
30. A observância desses deveres não só resolveria o grave problema da instrumentalização do conhecimento para fins político-ideológicos, como promoveria uma dramática elevação no nível de qualidade do ensino em nosso país. Infelizmente, porém, uma parte considerável dos atuais professores e autores de livros didáticos está convencida de que sua tarefa não é ajudar os estudantes a conhecer a realidade, mas ensinar-lhes a votar nos candidatos certos.
COMO COMBATER A DOUTRINAÇÃO POLÍTICO-IDEOLÓGICA NAS ESCOLAS
31. Sem uma profunda modificação da mentalidade hoje dominante nas universidades brasileiras – onde são formados os professores militantes –, o problema da doutrinação político-ideológica em sala de aula e nos livros didáticos não será solucionado.
32. A sociedade brasileira, todavia, não está condenada a assistir passivamente a abusos como os exemplificados na relação anexa.
33. Como impedir que isto aconteça? Tendo em vista a circunstância de os abusos da liberdade de ensinar ocorrerem no recinto fechado das salas de aula – o que torna praticamente impossível a fiscalização por parte da direção das escolas e dos pais dos alunos –, ninguém melhor do que os próprios estudantes para lhes opor resistência.
34. Para isso, no entanto, é necessário educá-los e informá-los quanto aos direitos compreendidos na sua liberdade de aprender, na forma do disposto no art. 4º, IV, da Lei 8.078/90:
Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: IV - educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo;
35. Ora, esse objetivo pode ser facilmente alcançado mediante a afixação de cartazes contendo a relação de deveres referida no item 29, em locais onde possam ser lidos por estudantes e professores.
36. Na medida em que sejam explicitados, esses deveres elementares tenderão a ser observados espontaneamente pelos professores, ao mesmo tempo em que os estudantes ficarão mais atentos e preparados para reconhecer quando estiverem sendo transgredidos e exigir a sua observância.
37. “Informar, conscientizar e motivar o consumidor através dos diferentes meios de comunicação” é, de resto, dever imposto ao Estado pelo Código de Defesa do Consumidor (art. 106). A afixação de cartazes contendo a relação de deveres do professor (não necessariamente aquela relação) tem precisamente essa finalidade: de um lado, informar e conscientizar os estudantes brasileiros dos direitos compreendidos em sua liberdade de aprender; e, de outro, motivá-los a exercer a defesa desses direitos.
38. Não podemos fechar os olhos para o que está acontecendo nas escolas brasileiras. Não podemos achar que tudo isto é normal. Não podemos ficar parados enquanto nossos jovens são manipulados intelectualmente por seus professores militantes. Não podemos negar a essas crianças e adolescentes os meios de que eles necessitam para defender a sua própria liberdade de aprender.
CONCLUSÃO
39. Diante dos fatos e argumentos expostos, os representantes requerem a Vossas Excelências a instauração de inquérito civil e, se necessário, o posterior ajuizamento de ação civil pública, objetivando a condenação das escolas públicas (por intermédio da Secretaria de Educação) e privadas desta cidade, que atuam no ensino fundamental e médio, e dos cursos pré-vestibulares a afixar, em local visível no interior de cada sala de aula, cartazes com a relação de deveres referida no item 29, ou equivalente.
Termos em que pedem deferimento.
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