segunda-feira, outubro 27, 2008

370) Estado fora=da-lei...

Artigo de Ribamar Oliveira
O Estado de S.Paulo, Segunda-Feira, 27 de Outubro de 2008
Caderno de Economia, p. B2

Expansão dos bancos públicos

A medida provisória 443, que autoriza o Banco do Brasil (BB) e a Caixa Econômica Federal (CEF) a comprarem bancos e outras empresas, despertou questionamentos jurídicos de toda ordem. Mas nenhum partido político, mesmo da oposição, quer discutir a constitucionalidade da MP no Supremo Tribunal Federal (STF), pois isso poderia passar à opinião pública uma idéia de que eles estão criando obstáculos ao governo neste momento de grave crise financeira internacional.

O ponto em questão é o artigo primeiro da MP 443 que autoriza o BB e a CEF a criarem subsidiárias, em número indefinido, sendo a única condição que elas sejam para o cumprimento de atividades de seu objeto social. Ocorre que o inciso XX do artigo 37 da Constituição Federal estabelece que depende de autorização legislativa, em cada caso, a criação de subsidiárias das empresas públicas ou sociedades de economia mista, assim como a participação de qualquer delas em empresa privada. A Constituição determina, portanto, que a criação de cada subsidiária de estatal ou empresa de economia mista necessita de prévia autorização legislativa.

Para contornar esse dispositivo constitucional, os ministros da Fazenda, Guido Mantega, do Planejamento, Paulo Bernardo, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, disseram ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na exposição de motivos que acompanhou a MP 443, que existe um precedente. ''Veja-se que tal procedimento (a criação de subsidiárias sem autorização legislativa) não traduz novidade, já havendo autorização semelhante concedida à Petróleo Brasileiro S.A. - PETROBRÁS na Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997'', destacaram.

É como se, em defesa da constitucionalidade da MP 443, eles dissessem apenas que os tucanos já utilizaram o mesmo expediente. A lei 9.478 - chamada de ''lei do petróleo'', aprovada pelo Congresso no primeiro mandado do presidente Fernando Henrique Cardoso - estabelece que a Petrobrás, no estrito cumprimento de atividades de seu objeto social, ''fica autorizada a constituir subsidiárias, as quais poderão associar-se, majoritária ou minoritariamente, a outras empresas''.

É óbvio que um precedente não garante caráter constitucional a qualquer medida. Mas é importante observar que o poder dado à Petrobrás para criar subsidiárias ao seu bel prazer, sem autorização legislativa prévia, nunca foi questionado no Supremo Tribunal Federal por qualquer partido político. Alguns viram inconstitucionalidade na MP 443 por receio, pois ela permite, no limite, a estatização de todo o sistema financeiro brasileiro.

Se a MP 443 é uma carta branca concedida ao BB e à CEF para comprarem instituições financeiras e criarem subsidiárias, é difícil imaginar como ela poderia ser diferente diante dos desafios colocados ao governo federal pela crise financeira internacional. Mais uma vez as razões para a MP estão explicitadas com clareza na exposição de motivos.

Os ministros disseram ao presidente que ''embora os reflexos da crise no Brasil sejam relativamente limitados em função da solidez macroeconômica do País e da solidez do sistema financeiro nacional, a contração da liquidez pode estimular um movimento de consolidação financeira no País''. Em outras palavras, a crise de liquidez poderá levar a uma concentração bancária com os grandes bancos comprando os pequenos e os médios.

A pergunta que se coloca é porque não deixar a cargo da iniciativa privada essa ''consolidação financeira no País''. A resposta também está na exposição de motivos. Os ministros disseram ao presidente que ''pelas regras atualmente vigentes, os principais bancos públicos do País, o BB e a CEF, têm restrições a sua atuação num eventual processo de consolidação do sistema financeiro nacional. Tal restrição tem duas conseqüências indesejáveis: uma menor concorrência entre os potenciais investidores, reduzindo o valor dos ativos negociados, e a eventual perda de oportunidade de expansão das instituições financeiras federais''.

A primeira justificativa parece razoável, uma vez que os grandes bancos poderão mesmo estrangular os pequenos e médios para comprá-los por preços menores. Portanto, o governo está certo ao permitir que as instituições públicas também participem da disputa. Mas a segunda justificativa levanta uma questão ideológica, pois indica que o governo Lula está interessado na expansão das instituições financeiras federais.

============

Meus comentários:
A MP 443, assim como outras medidas anteriores (e certamente futuras também) nos confirma, mais uma vez, que o principal infrator da legalidade, no Brasil, é o próprio Estado; ele atua como um fora-da-lei, ao violar a Constituição e as leis existentes, como pretende fazer no caso da fusão da Oi com a BrTelecom, como fez quando da criação de uma TV estatal, como fez ao emitir clandestinamente numa outra MP uma autorização para cobrar tarifas específicas (ad rem) sobre produtos importados, ao cobrar Cofins de produtos importados, ao fichar turistas americanos de maneira discriminatória e sem qualquer base legal (pior, sem qualquer finalidade específica, a não ser atender a um vago princípio da reciprocidade), enfim, ao decretar um sem número de medidas provisórias que muito raramente são caraterizadas pela urgência ou necessidade.
Ou seja, o Estado é de fato o principal infrator da legalidade no país. Ele é o grande fora-da-lei.
Em qualquer país decente, o Tribunal Superior já teria cerceado esse festival de ilegalidades...
PRA

Nenhum comentário: