Egito: arabizado ou islamizado?
Por José Farhat (Instituto de Cultura Árabe)
Correio do ICArabe, ano 5, edição 213, de 4 a 13 de setembro de 2009
A existência da civilização egípcia é identificada desde os VII e V milênios aC sendo que, por volta do ano 5.500, já havia uma economia vilareja associada às primeiras necrópoles e, na altura dos anos 4.500, apareceram as primeiras tentativas de unificação de tais vilas em torno de dinastias, com o início de aspectos civilizatórios faraônicos.
O Egito dos faraós foi unificado entre 3.150 e 2.700 aC, período em que também apareceu a escritura hieroglífica; entre 2.700 e 2.190 aC foram construídas pirâmides; de 2.160 a 2.060 aC, começaram a ocorrer distúrbios políticos e sociais; mas, mesmo assim, entre 2.060 e 1.785 aC, o Egito ampliou suas fronteiras com a ocupação da Síria e da Núbia.
No espaço de tempo de 1.780 e 1.550, o Egito foi invadido pelos Hyksos, um povo guerreiro vindo da Ásia, mas nem por isto perdeu a sua característica de civilização faraônica. Durante o segundo império tebano (derivação do nome da capital: Tebes), já era considerado uma das grandes potências do Oriente Próximo, quando teve um avanço artístico inigualável e foram construídas cidades inteiras, assim como o Vale dos Reis.
Entre 1.085 e o VI século aC, o Egito perdeu sua unidade política, com a alternância de dinastias estrangeiras e nacionais egípcias no poder. Ainda assim, o período foi marcado por uma grande atividade arquitetônica. Nesta fase, o país foi invadido pelos assírios e, no ano 525 aC Cambyse, o rei da Pérsia, ocupou o Império, sendo que, entre os séculos VI e V AC, ocorreu uma sucessão de reis persas e egípcios.
O Egito se tornou helenístico em 332 aC, quando foi conquistado por Alexandre 1º, o Grande. A dinastia grega dos Lagides reinou sobre o Egito de 305 a 30 aC.
Entre 30 aC e 395 dC, o Egito foi uma dependência do Império Romano, quando o cristianismo se desenvolveu. De 395 a 639, continuou sob soberania cristã bizantina e, é nesta época, que se forma a Igreja Copta (hoje oficialmente conhecida como Igreja Ortodoxa Copta de Alexandria).
Às vésperas da conquista árabe e, na verdade, desde o século VI aC, o Egito já perdera sua identidade dos tempos áureos dos Faraós, invadiu outros países e foi invadido por outros povos. Sua religião passou desde a adoração ao sol até chegar ao cristianismo. A língua de seu povo variou de acordo com as suas circunstâncias e o país perdeu sua identidade original. Era o início nova era.
Quando se fala da tomada do Egito pelos árabes, vem imediatamente à mente a figura de seu conquistador: Amr ibn Al-As (xx – 663 dC), cuja biografia ilustra não somente esta como também outras vitórias suas nos diversos campos de batalha. Pertencente, como o Profeta Muhammad, à tribo de Quraysh, ele aceitou o Islã entre 629 e 630. O Profeta o enviou a Omã numa missão de paz e ele a cumpriu convencendo os governantes de Omã a se converterem à nova religião. As suas atividades militares começaram por ordem de Abu-Bakr Abdallah ibn Abi Quhafa (573 – 634 dC), o primeiro Califa do Islã, à testa de uma das três forças militares enviadas à Palestina, onde tomou parte nas batalhas de Ajnadayn e do Rio Yarmuk e foi responsável pela conquista muçulmana do sudeste da Palestina. Seu maior feito foi, no entanto, a conquista do Egito, campanha que dizem ter sido empreendida por conta própria.
Durante 640 e 641 dC, Amr ibn Al-As derrotou as forças bizantinas que defendiam a cidade do Cairo, seus arredores e toda a região e, em 642 dC, entrou triunfante em Alexandria, a capital do Egito bizantino.
Inegavelmente um líder guerreiro, ele foi capaz de realizar o sonho de união do que é hoje o Egito. Revelou-se um administrador competente e político de primeira linha. Logo após a conquista do Egito, organizou o sistema financeiro e de administração da justiça e fundou, perto do Cairo, a cidade fortaleza de AL-Fustat, garantido a defesa regional.
Muwayah ibn Abu-Sufian (602 – 680 dC), governador de Damasco o qual, com a ajuda de Amr nas batalhas decisórias para a sucessão do califado islâmico, tornou-se o quinto califa, confirmou-o como governador do Egito, em 661 dC. A contribuição de Amr não se restringiu à conquista e governança do Egito já que Muwaya se tornaria o fundador da dinastia Omíada, que governaria o império islâmico de 661 a 750 dC, tendo Damasco como capital. Entretanto, esta, foi derrotada pela dinastia dos Abássidas, da qual um dos membros estabeleceria a dinastia que governaria a Península Ibérica desde 756 até 1031 dC.
Indagar se o Egito foi arabizado ou islamizado nos remete ao Islã, ao Arabismo e ao fato de que os triunfos daquele acabaram sendo absorvidos por este. Os árabes foram privilegiados a partir do momento em que sua língua foi escolhida para levar a mensagem divina, por meio do Alcorão, para todos os seres humanos, pelos séculos afora. Acrescenta-se a isto outro fator importante: os árabes eram os vencedores e, como tal, suas relações com os povos dos países conquistados teve como base a aceitação ou recusa da submissão. Muitos destes povos aceitaram o Islã e não o Arabismo, a exemplo dos persas, curdos, turcos e outros mais, donos de culturas bem definidas e enraizadas.
Não era este o caso do Egito, que perdera a sua civilização a força de tantas conquistas e imposições de culturas alienígenas. O povo egípcio, na alvorada da conquista, não tinha mais sólidas tradições locais ou nacionais, fazendo com que o Islã e o Arabismo fossem absorvidos totalmente e de forma duradoura. Até mesmo a Igreja Copta foi influenciada e abandonou a língua grega, adotando o árabe como língua de seus rituais. O Egito, portanto, foi arabizado e islamizado, ao mesmo tempo e para sempre.
José Farhat é cientista político e membro do ICArabe
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