sexta-feira, novembro 16, 2007

275) Economics 000: textbook versao Venezuela

Sempre é interessante usar exemplos concretos para aulas de economia.
O caso da Venezuela constitui aquilo que os americanos chamariam de "a case in point".
Ou seja, tudo o que não se deve fazer em economia está sendo praticado naquele país. Trata-se de um manual ao contrário: "tudo o que nunca se deveria fazer, sendo feito..."
Para tristeza (e pobreza) dos venezuelanos...


CRISE DE ABSTECIMENTO
Preços estão abaixo da margem de lucro
POPULAÇAO MAIS IGNORANTE QUER MÃO DE FERRO

Contagem regressiva para crise óbvia e estatização do leite, da carne, do pão, do açúcar, a partir de dezembro.
A Venezuela, tida como um dos países mais ricos do continente sul-americano graças à suas vastas reservas de petróleo, enfrenta uma grave crise de abastecimento de alimentos da cesta básica.

Produtos como leite, açúcar e ovos se tornaram iguarias no país, que enfrenta as conseqüencias de mais uma situação derivada, em grande parte, da disputa política entre o governo do presidente Hugo Chávez e setores identificados com a oposição.

O setor industrial afirma que a crise no abastecimento resulta da política de ajuste dos preços da cesta básica determinada pelo governo, que, segundo o setor, tornaria o mercado produtor pouco rentável.

O governo argumenta que o desabastecimento tem origem em dois fatores: o aumento da demanda e a "sabotagem" do setor industrial, que teria como objetivo desgastar o governo do presidente Hugo Chávez.

"Nós admitimos que há um problema pontual com o leite, mas não há uma escassez generalizada de alimentos", explicou o ministro de Agricultura, Elias Jaua, em uma nota divulgada por seu Ministério.

Jaua afirma que os produtos não chegam ao consumidor porque há um "setor oligopolizado que domina a compra dos alimentos primários".

Para Eduardo Gomez, presidente da Confederação de Indústrias (Conindustria), o ajuste de preços gerou perdas para alguns setores de produção de alimentos. "Não há estímulo para a produção nacional", disse, em entrevista à BBC Brasil.

Sobre a escassez do leite, Gomez admite que os produtores simplesmente deixaram de produzir.

"Muitos pararam de ordenhar as vacas, pois isso deixou de ser negócio", afirma Gomez.

O governo determinou que o litro de leite, que custava aproximadamente US$ 0,50, deveria ser congelado em US$ 0,40.

Nas últimas semanas, tanto na rede de supermercados populares Mercal (subsidiada pelo governo) como nos supermercados dos bairros de classe alta em Caracas, quem quiser comprar um litro de leite ou um quilo de açúcar tem que enfrentar horas na fila.

Em Gramoven, na periferia da capital venezuelana, a reportagem da BBC Brasil encontrou a dona de casa Keren Quintana, que chegou a esperar sete horas na fila do Mercal para conseguir um quilo de leite em pó. "Tenho que enfrentar a fila, tenho dois filhos pequenos", contou ela.

Para a dona de casa, tanto os produtores de leite como os administradores do mercado popular são responsáveis pelo desabastecimento. "Querem que responsabilizemos Chávez por isso", comenta.

Keren Quintana diz que a escassez não influenciará seu voto em dezembro, quando os venezuelanos vão às urnas para decidir se aprovam ou não a reforma constitucional proposta pelo presidente.

"Sabemos que não depende só dele, mas espero que ele ponha mão firme para solucionar o problema", afirma.

Nas últimas semanas o Instituto de Atenção ao Consumidor tem confiscado alimentos que são encontrados estocados ou com preços acima do regulado. O caso mais emblemático foi o confisco de 125 toneladas de leite de um depósito da Nestlé.

Mais 40 toneladas de açúcar refinado também foram encontradas em um estacionamento de um edifício no bairro de classe média El Paraíso, em Caracas. Os donos da mercadoria não foram identificados.

A demanda dos produtos da cesta básica também aumentou. O poder aquisitivo das classes E e D subiu 150% nos últimos quatro anos, de acordo com dados oficiais. O governo argumenta que a escassez também é fruto da inclusão desses consumidores. De acordo com o setor industrial, a demanda cresceu em 30% nos últimos anos.

As estimativas são de que a oferta da produção nacional caiu e atende a apenas 8% da demanda por alimentos da cesta básica.

Na Venezuela, 70% da alimentação é proveniente de importações. Nas prateleiras do mercado subsidiado pelo governo, o frango é brasileiro, a carne argentina e os ovos colombianos.

"Parte da causa do déficit entre o consumo e a produção nacional é que haviam 6 milhões de hectares de terras que estavam absolutamente ociosas", justifica o ministro de Agricultura. Deste total, o Estado desapropriou 28% das terras.

A reforma constitucional proposta por Chávez prevê a proibição do latifúndio
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Democracia em perigo na Venezuela
Entrevista a Dom Baltasar Porras, vice-presidente do CELAM

ROMA, quinta-feira, 15 de novembro de 2007 (ZENIT.org).- Em uma entrevista concedida à Agência Zenit, Dom Baltasar Porras, ex-presidente da Conferência Episcopal da Venezuela e hoje primeiro vice-presidente do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), lança um alarme ante as ameaças à democracia do que se chamou ideologia socialista-bolivariana.

Dom Baltasar, arcebispo de Mérida, capital do estado homônimo – no noroeste da Venezuela, a 1.600 metros de altura –, encontra-se atualmente em Roma para visitar Bento XVI, junto com a presidência do CELAM.

Publicamos a conversa que manteve com Giorgio Salina, presidente da Associação para a Fundação Europa.

O presidente venezuelano propõe uma reforma constitucional em 30 artigos, aos que a Assembléia Nacional acrescentou outros 30; tudo isso será objeto de um referendum que suscita fortes reações. Em que consiste e por que tanta preocupação?
–Dom Baltasar: Podemos dizer que o que será submetido a referendum não é uma revisão da Constituição, mas uma nova Constituição que, de fato, confere praticamente plenos poderes ao presidente e ao governo, expropriando, apesar das aparências, os espaços de participação do povo.
Também as propostas podem ser aceitas ou rejeitadas só em bloco e não seletivamente, impedindo assim qualquer oportuno discernimento entre os diversos artigos.

Um recente documento da Conferência Episcopal da Venezuela (CEV), expressa preocupação e é severo ante a proposta de reforma, até o ponto de defini-la como «moralmente inaceitável». O senhor poderia comentá-lo?
–Dom Baltasar: Os recentes pronunciamentos da Igreja, tanto da hierarquia como das comunidades religiosas e laicas, são bem acolhidos e agradecidos pelo povo, que os percebe em defesa dos direitos de todos, e não só de quem tem o poder e atua com a força.
Os bispos em especial definiram como «moralmente inaceitável» esta proposta por quatro razões:
– É mais que uma reforma, como disse antes;
– De fato, fragiliza a tutela dos direitos humanos, aumentando a falta de credibilidade incontrastável do Governo;
– Votar sessenta artigos agrupados em dois blocos impede toda eleição seletiva, limitando de fato a liberdade de expressão da vontade popular.
– A campanha eleitoral e fortemente manipulada que prevê possibilidades muito diversas de informação entre propaganda governamental, oposição e sociedade civil.

–A agência France Presse (AFP) há pouco deu notícia de uma manifestação, definida de massa, a favor do Governo. O que pode nos dizer a respeito?
–Dom Baltasar: Deve-se levar em conta que a participação, nas manifestações promovidas pelo Governo, é obrigatória para todos os empregados públicos, aos que asseguram a disponibilidade de meios de transporte, proporcionando também alimentação e reconhecendo aos participantes uma «indenização» econômica! Tudo isso porque o que interessa ao Governo é o efeito na mídia, perseguido através dos principais meios de informação.
As condições para a oposição são muito diferentes: deve enfrentar dificuldades logísticas de todo tipo, e as possibilidades de informação são muito mais limitadas. Também todo o mundo viu na televisão, após poucas horas, a deserção massiva, e se pôde escutar o claro eco de um evidente mal-estar e descontento.

–A agência Associated Press (AP) fala de uma manifestação pacífica para pedir ao Tribunal Supremo que prorrogue o tempo disponível para informar sobre o texto e difundir os motivos de oposição. A manifestação se desenvolveu pacificamente, mas no campus universitário foi objeto de graves ataques por pessoas, estudantes..., armados e apoiados por elementos próximos do Governo. Quais são suas considerações?
–Dom Baltasar: É verdade, é exatamente o que aconteceu em San Cristóbal, em Maracaibo e em Caracas. Hoje, na Venezuela, muita gente está armada, a polícia lhes assegura impunidade, e isso aumenta a insegurança e o medo. A violência suscitada por infiltrações no campus universitário justifica a intervenção do Governo contra a autonomia da Universidade.

Duas expressões do serviço informativo da AP são preocupantes. A primeira afirma que o resultado positivo do referendum enfraqueceria as liberdades civis; a segunda fala do risco de arrastar a Venezuela em uma aventura que ninguém deseja. O senhor nos ajudaria a interpretá-las?
–Dom Baltasar: Claro que sim. Enfraquece os direitos civis porque limita as liberdades e aumenta a falta de credibilidade do poder: quem não é socialista-bolivariano não é um bom venezuelano e, portanto, pode ser perseguido. Também a experiência comunista de Castro é estranha à nossa cultura, por isso ninguém assegura aventuras deste gênero; as posições que se remetem ao Che Guevara são percebidas como violência e injustiça.

–Se o referendum tivesse resultado positivo, quer dizer que a maioria do povo está com Chávez e compartilha de suas propostas e, portanto, se deveria de qualquer forma aceitar uma eleição democrática. O senhor compartilha esta afirmação?
–Dom Baltasar: Não, não seria de qualquer forma uma eleição democrática. Basta pensar em um só dado: 80% do tempo no rádio e televisão está dirigido pelo poder atual, enquanto apenas 20% do tempo, obviamente nos horários de menor audiência, se deixa à oposição. Também outro grave problema se refere ao acompanhamento sério e independente da jornada eleitoral, insubstituível função de controle para garantir a democracia, que devemos reconhecer que falta na Venezuela.

Certo, é preciso reconhecer também que a oposição está dividida e não é capaz de fazer uma proposta unitária; as alternativas propostas vão desde a abstenção à participação com voto contrário, mas isso cria incerteza.

Devo dizer que, para o nosso país, lamentavelmente, não vejo um futuro de pacificação, mas de contrastes, um futuro de conflito. O comunismo de Castro não faz parte do panorama que o povo venezuelano deseja.

A situação que nos descreveu influi na vida da Igreja e das comunidades cristãs do país? Como?
–Dom Baltasar: O resultado imprevisível desta situação é um forte senso de unidade dentro da Igreja, e entre a Igreja Católica e outras confissões. Esperavam dividir a Igreja por dentro e, ao contrário, apesar de poucos sacerdotes que fazem muito barulho na rádio e na televisão, bispos, sacerdotes e leigos estão muito unidos e solidários.

E isso apesar de que se usa e abusa de símbolos cristãos, e todo o Governo se declara católico. É uma tática que até agora fracassou. Enquanto uma exígua minoria de cristãos é partidária do Governo, em aspectos de defesa da liberdade, direitos humanos, paz interna e externa, produz-se uma grande consistência, sublinhada por um aumento de vocações e conversões. Tudo isso enquanto contamos cerca de duzentos assassinatos cada semana, sem contar a captura de reféns, intimidações, etc., com a conivente indiferença do poder.

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