domingo, janeiro 15, 2006

35) O Império em controvérsia: editor sugere que a CIA lhe pague um "mensalão"


Abaixo transcritos os comentários do editor da revista Primeira Leitura à "sugestão" do professor Moniz Bandeira de que a revista e o seu resenhista crítico pudessem estar sob influência da CIA, ao apreciarem negativamente o livro do primeiro sobre a formação do Império americano.
A acusação pode não ser implausível, já que a CIA envolveu-se, em sua trajetória de mais de meio século, nas mais rocambolescas aventuras, dilapindo os seus recursos -- e os dólares do contribuinte americano -- nos episódios mais inverossímeis da história da espionagem mundial.
Não há por que recusar, numa hipótese arriscada, que ela possa estar envolvida, também, com críticas literárias, em especial resenhas de livros sobre o império em questão. Afinal de contas, uma das melhores análises que eu li sobre a obra do professor Henri Kissinger foi feita por um "filósofo da CIA". Vale a pena conferir: Peter W. Dickson, Kissinger and the Meaning of History (New York, Cambridge-University Press,1978).
Se a CIA tem até filósofos profissionais, por que ela não poderia ter o seu próprio plantel de resenhistas?

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link: http://www.primeiraleitura.com.br/auto/entenda.php?id=6872
Eu, um agente da CIA
Por Reinaldo Azevedo

Há quantos anos vocês não ouvem ou lêem a acusação de que alguém é agente da CIA? Existe coisa mais cafona, bocomoco e bocó do que isso? Pois é. O professor Moniz Bandeira, aquele que é leitura obrigatória no Itamaraty e cuja obra serve de instrumento de tortura, ou trote, dos candidatos ao Instituto Rio Branco, concedeu uma entrevista ao site do PT (claro...) e não fez por menos: acusou Primeira Leitura e seus diretores de “instrumento da black propaganda da CIA”.

E tudo porque, como já relatei aqui (leia textos nesta edição), publicamos uma resenha em que o filósofo Roberto Romano faz picadinho (delicioso!) do livro Formação do Império Americano – Da Guerra contra a Espanha à Guerra no Iraque. Sim, Moniz Bandeira é o autor do livro — ou o culpado por ele, talvez seja o caso de dizer.
Uma parte da polícia religiosa do PT costuma me acusar de ser membro da Opus Dei. A imputação, que nada teria de criminosa, é, de todo modo, falsa. Mas, ao menos, está na moda. Agente da CIA? Recende ao mesmo bolor que se encontra nas idéias e nos textos de Moniz Bandeira.

O homem tem sua graça. Acionou um dos mais caros escritórios de advocacia do país para me cobrar “direito de resposta”. E já mandou o texto que pretende ver publicado em Primeira Leitura. Não publico. Direito de resposta para uma resenha? Seria um caso inédito na história das democracias ocidentais. Só o farei se o juiz mandar, é claro. No site do PT, referindo-se a Romano e à revista, Moniz Bandeira afirmou que “houve dolo, tanto desse escriba de aluguel quanto da revista, ao cometerem os delitos de injúria e na difamação.” Não é espantoso? O homem que escreveu mais de 400 páginas contra o Império Americano não pode suportar uma crítica negativa a seu livro sem tomá-la como ofensa pessoal. Imaginem se ele fosse o comandante do Império Americano...

Sem que tenha sido, quero crer, devidamente instruído por seus advogados, acusa-me de agente de um serviço de Inteligência de um país estrangeiro. Um espião. Imputa-me um crime. Trata-se, claro, de uma calúnia, já que é uma afirmação falsa e, dado o contexto, desonrosa. Trata-se de uma difamação, já que ele busca, com isso, atingir a minha reputação; e a tríade se completa, obviamente, com a injúria. Não sei se vou processá-lo.

O escritório Noronha Advogados, que cuida de seus interesses, deve admitir: seria uma dessas querelas mamão-com-açúcar, uma vez que nem o acusador nem os causídicos conseguiriam provar que estou a serviço da “black propaganda da CIA” — eu gosto é de Black Label; eu e Lula; mas pago o meu. Trata-se de uma vitória (minha) anunciada. Nem Romano nem Primeira Leitura jamais dirigiram qualquer ofensa ao autor. Já a acusação dele tem caráter pessoal. O diabo é que não quero entrar na Justiça contra Moniz Bandeira. Nada do que ele diz, pensa ou escreve me interessa.

Suas idéias recendem a naftalina ideológica. Quero distância desses caras. Não são meus adversários qualificados. Mas e daí? Se ele continuar a encher meu saco, terei de processá-lo. A alternativa é a CIA, finalmente, fazer contato e passar a me pagar um mensalão, garantindo-me a boa vida e acabando com a minha, como direi?, inocência. Já imaginaram? Ouro de Washington para Reinaldo Azevedo trair os interesses nacionais publicando resenhas desancando os livros de Moniz Bandeira: ele como Santo Guerreiro, e eu como o Dragão da Maldade. O chato é que a CIA deve estar ocupada com outros assuntos, como, por exemplo, produzir relatórios idiotas afirmando que Lula é uma alternativa anti-Chávez... A agência continua a saber menos do que marido traído.

A graça do homem não termina aí. Diz que Romano “escreveu sob encomenda, conforme o próprio diretor da revista [no caso, eu] confessou na introdução da matéria.” Santo Deus! É claro que encomendei o texto. O que ele queria? Acha que, para ter um artigo publicado em Primeira Leitura, é preciso acionar um batalhão de advogados? Isso vale para um Moniz Bandeira, não para um Roberto Romano — que, além de um grande intelectual, é um cavalheiro. Encomendei, sim, a resenha. Mas não ousaria tentar conduzir o texto do autor. Aquele que se quer o grande teórico do nacionalismo brasileiro pode não acreditar, mas é possível haver uma relação civilizada entre homens livres.

Na mesma entrevista ao PT, ele diz que “uma parte da mídia, possivelmente encorajada por pessoas que a CIA (de novo!), instrumentaliza para promover a black propaganda”, move uma campanha contra o Itamaraty, em especial contra o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, o segundo das Relações Exteriores e justamente o homem que impõe aos diplomatas e candidatos a tanto a leitura dos livros de... Moniz Bandeira. Para ele, esses traidores é que criam a falsa idéia de que a política externa brasileira é um desastre. Ele, obviamente, só vê sucessos.

O homem que sustenta em livro que o governo dos EUA poderia, se quisesse, ter impedido os atentados de 11 de Setembro, mas não o fez porque eles seriam úteis (é coisa de hospício intelectual, mas está lá) conclui a sua entrevista dizendo que, quando o Brasil subscreveu o Tratado de Não-Proliferação das Armas Nucleares, ainda no governo FHC, o fez “a fim de contentar os Estados Unidos”. Para ele, a assinatura é um “ato discriminatório”. Não deve ser outro o juízo de Mahmoud Ahmadinejad, o presidente do Irã que inventou o populismo islâmico-xiita-nuclear. E ele vai além: nega a formidável coleção de desastres da política externa brasileira e diz que “derrotas estão a sofrer os que querem baixar a cabeça ante os Estados Unidos.”

É isso aí. Não sei se processarei Moniz Bandeira. A minha tendência, lendo o que escreve, é considerá-lo inimputável.

[reinaldo@primeiraleitura.com.br]
Publicado em 15 de janeiro de 2006.

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Aguardem novos episódios...

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