Apenas transcrevendo, para que não se perca certas manifestações de imbecilidade galopante:
O "socialismo dos tolos"
Por: Nuno Guerreiro Josué *
proprietário e redator do blog português Rua da Judiaria.
Um glorioso choque cultural que recentemente aconteceu no Irã fez-me rir em voz alta. Os filhos de Che Guevara, o pin-up revolucionário, foram convidados à Universidade de Teerã para comemorar o 40º aniversário da morte de seu pai e para celebrar a crescente solidariedade entre "e esquerda e o Islã revolucionário", participando numa conferência parcialmente custeada pelo presidente venezuelano Hugo Chavez.
Houve saudações fraternais e sorrisos gerais à medida que eram denunciadas "as ambições planetárias devoradoras" dos Estados Unidos da América. Mas foi então que um dos oradores, Hajj Saeed Qassemi, o coordenador da Associação dos Voluntários Mártires-Suicidas (que presumivelmente se mantém vivo desinteressadamente em nome da causa), revelou que Che era "um homem verdadeiramente religioso que acreditava em D-us e que odiava o comunismo e a União Soviética".
Aleida, a filha de Che, interrogou-se se algo se teria perdido na tradução. "O meu pai nunca mencionou D-us", disse ela, para consternação da assistência. "Ele nunca conheceu D-us". Na confusão, Aleida e o irmão foram rapidamente acompanhados à saída e escoltados para o hotel. "No fim do dia, os dois Gueveras tinham-se tornado 'não-pessoas'. A imprensa controlada pelo Estado subitamente esqueceu sua existência", registrou o escritor iraniano Amir Taheri.
Depois da sua partida, Qassemi prosseguiu afirmando que Fidel Castro, o "guia supremo" de Che Guevara, é também um homem de D-us. "A União Soviética acabou", disse ele. "A liderança dos oprimidos passou para a nossa república islâmica. Aqueles que querem destruir a América têm de perceber isto e deixar os jogos de palavras".
Este texto é o princípio de um artigo assinado por Sarah Baxter no Sunday Times de Londres (onde são analisadas as irrefletidas e afetuosas relações entre a esquerda "revolucionária" ocidental e o fundamentalismo islâmico. O texto pode ser lido na integra em Times Online – Where do you stand in the new culture wars? (www.timesonline.co.uk/tol/news/world/middle_east/article2701379.ece).
Mas sintomático é também o fato dos emblemáticos filhos de Guevara (e Hugo Chavez, Daniel Ortega e Evo Morales antes deles) nem terem pensado duas vezes em associar-se à figura sinistra de Ahmadinejad – o testa de ferro de um regime que demanda o extermínio dos judeus, persegue minorias étnicas e religiosas no seu território (ver Iran: Death penalty/stoning - Amnesty International [http://web.amnesty.org/library/Index/ENGMDE131132006?open] e Murder with Impunity: Iran targets the Baha'i – again [www.weeklystandard.com/Content/Public/Articles/000/000/014/284idyfu.asp}; executa comunistas e homossexuais (ver Report: Iran Gay Teens Executed [www.365gay.com/newscon05/07/072105iran.htm}; Iran:Two More Executions for Homosexual Conduct - Human Rights Watch [http://hrw.org/english/docs/2005/11/21/iran12072.htm])… e nos últimos tempos, após a infame "conferência" para negar a veracidade do Holocausto, se tornou a "luz" que ilumina as cabeças (algumas raspadas) de energúmenos neonazistas.
Outro exemplo dessa estranha relação simbiótica, entre movimentos que racionalmente seriam naturalmente opostos, é o encontro que reúne anualmente, no Cairo, esquerdistas revolucionários europeus (a esmagadora maioria dos quais "ateus, laicos e republicanos") e membros da Fraternidade Islâmica, uma organização cujo lema é: "Alá é o nosso objetivo. O Profeta o nosso líder. O Corão a nossa lei. Jihad é o nosso caminho. Morrer pelo caminho de Alá é a nossa maior esperança." O programa da reunião de maio último, dispensa comentários e foi recentemente publicado na outrora respeitada revista marxista Monthly Review e pode ser lido em "Resistance Movements Unite! Cairo International Conference and Liberation Forum" (http://mrzine.monthlyreview.org/cairo021107.html).
Unidos por ideais comuns de um antiamericanismo e de um anti-semitismo primários, o fanatismo religioso e aqueles que sopram as últimas cinzas do materialismo dialético vão encontrando terreno comum naquilo que, nos finais do século XIX, August Bebel chamou "o socialismo dos tolos".
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