domingo, junho 18, 2006

106) Espalhando praga, por motivos ideologicos


Quando a li a reportagem da Veja desta semana, relatando este caso de contaminação deliberada dos cacaueiros da Bahia por militantes do PT interessados em combater o poder dos coronéis da região, achei inacreditável que funcionários da CEPLAC e outros militantes chegassem ao extremo de provocar uma "hecatombe econômica" -- pois é disso que se tratou -- apenas por interesse político.
Trata-se de algo criminoso, e merecedor de punição exemplar, pois inviabilizou uma importante atividade econômica que colocava o Brasil em lugar de destaque no comércio internacional de cacau e pasta de cacau.
Tudo isso foi destruído por cegueira ideológica e certamente mau-caratismo político, além de suprema irresponsabilidade econômica e sanitária.
A matéria do jornal Estado de S.Paulo deste domingo, 18 de junho de 2006, resume a história da Veja, que deve no entanto ser lida, pois ela traz os elementos irrefutáveis de uma história escabrosa.

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Praga foi sabotagem, diz militante
Denúncia: petistas disseminaram praga que arrasou cacau na Bahia
O Estado de São Paulo, Domingo, 18 junho de 2006
(Matéria original neste link)

Uma das piores pragas biológicas que já atingiram o País pode ter tido origem em ato de sabotagem, e não sido conseqüência de fenômeno natural. Reportagem da revista Veja aponta que a praga devastadora conhecida como vassoura-de-bruxa (crinipellis pernicosa) que arrasou as plantações de cacau no sul da Bahia, em 1989, foi resultado de ação de integrantes do PT.

O diretor-geral da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), Gustavo Moura, defendeu ontem a idéia de que Luiz Henrique Franco Timóteo, que admitiu ter espalhado a praga em entrevista a Veja, seja investigado pela Polícia Federal e responsabilizado pelas sabotagens às lavouras de cacau nos anos 80. "Isso é um caso de polícia", disse Moura.

Franco Timóteo confessou ter organizado ações para espalhar a praga nas lavouras cacaueiras no sul da Bahia com o objetivo de atingir o poder econômico e político dos barões do cacau. Militante do PDT na época, Timóteo acusou pessoas ligadas ao PT de terem ajudado na disseminação do fungo da vassoura-de-bruxa. "Um indivíduo que assume isso está assumindo uma ação criminosa e deve ser responsabilizado", acrescentou o diretor da Ceplac.

Franco Timóteo contou que trouxe os ramos infectados com a vassoura-de-bruxa do Norte do País, onde a praga é endêmica. A primeira fazenda escolhida para a distribuição da praga nas plantações, segundo ele, chamava-se Conjunto Santana, em Uruçuca, de Francisco Lima Filho, então presidente local da União Democrática Ruralista (UDR) e partidário da candidatura presidencial de Ronaldo Caiado. A operação criminosa, chamada pelo grupo de "Cruzeiro do Sul", estendeu-se entre 1989 e 1992.

Daí para a frente, segundo Franco Timóteo, os focos de praga se propagaram espontânea e rapidamente. O auge ocorreu no fim da década de 90, quando a safra brasileira de cacau, afetada pela vassoura-de-bruxa na Bahia, passou por drástica redução, de 406 mil toneladas ao ano (entre 84 e 85) para 123 mil entre 1999 e 2000.

Pelos dados do Ceplac, o Brasil, que era o segundo maior produtor de cacau, com média de 350 mil toneladas por ano, importa hoje cerca de 70 mil toneladas para completar a produção interna, de 130 mil toneladas.

Entre as ações desenvolvidas para o controle da praga na época, em setembro de 2000 o Fundo Baiano de Defesa da Cacauicultura (Fundecal) anunciou investimento de R$ 1,3 milhão no projeto de pesquisa de mapeamento do DNA da praga. Em 2001, o governo liberou aos cacauicultores recursos de R$ 200 milhões para a renovação de lavouras de cacau em uma área de 150 mil hectares atingida pela praga. Com a economia rural da região dizimada, em abril de 2001 o projeto genoma brasileiro passou a estudar o fungo da vassoura-de-bruxa cacaueira. Os sinais de resistência à praga foram obtidos após a primeira safra de cacau modificado, em agosto de 2001."

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E agora a reportagem da revista Veja (neste link)

Veja, Edição 1961 . 21 de junho de 2006
Brasil
Terrorismo biológico
Petistas são acusados de disseminar a praga que destruiu a lavoura de cacau no sul da Bahia

No dia 22 de maio de 1989, durante uma inspeção de rotina, um grupo de técnicos descobriu o primeiro foco de uma infecção devastadora conhecida como vassoura-de-bruxa numa plantação de cacau no sul da Bahia. A praga é mortal para os cacaueiros. Os técnicos, porém, se tranqüilizaram com a suposição de que se tratava apenas de um foco isolado. Engano. Em menos de três anos, de forma espantosamente veloz e estranhamente linear, a vassoura-de-bruxa destruiu as lavouras de cacau na região – e fez surgir um punhado de explicações para o fenômeno, inclusive a de que o Brasil poderia ter sido vítima de uma sabotagem agrícola por parte de países produtores de cacau da África, como Costa do Marfim e Gana. Reforçando, então, as suspeitas de sabotagem, técnicos encontraram ramos infectados com vassoura-de-bruxa amarrados em pés de cacau – algo que só poderia acontecer pela mão do homem, e nunca por ação da própria natureza. A Polícia Federal investigou a hipótese de sabotagem, mas, pouco depois, encerrou o trabalho sem chegar a uma conclusão. Agora, dezessete anos depois, surge a primeira testemunha ocular do caso. Ele conta que houve, sim, sabotagem, só que realizada por brasileiros.

Em quatro entrevistas a VEJA, o técnico em administração Luiz Henrique Franco Timóteo, baiano, 54 anos, contou detalhes de como ele próprio, então ardoroso militante esquerdista do PDT, se juntou a outros cinco militantes do PT para conceber e executar a sabotagem. O grupo, que já atuava em greves e protestos organizados na década de 80 em Itabuna, a principal cidade da região cacaueira da Bahia, pretendia aplicar um golpe mortal nos barões do cacau, cujo vasto poder econômico se desdobrava numa incontrastável influência política na região. O grupo entendeu que a melhor forma de minar o domínio político da elite local seria por meio de um ataque à base de seu poder econômico – as fazendas de cacau. "O imperialismo dos coronéis era muito grande. Só se candidatava a vereador e prefeito quem eles queriam", diz Franco Timóteo. A idéia, diz ele, partiu de Geraldo Simões, figura de proa no PT em Itabuna que trabalhava como técnico da Ceplac, órgão do Ministério da Agricultura que cuida do cacau. Os outros quatro membros do grupo – Everaldo Anunciação, Wellington Duarte, Eliezer Correia e Jonas Nascimento – tinham perfil idêntico: eram todos membros do PT e todos trabalhavam na Ceplac.

Franco Timóteo conta que, bem ao estilo festivo da esquerda, a primeira reunião em que o assunto foi discutido aconteceu num bar em Itabuna – o Caçuá, que não existe mais. Jonas Nascimento explicou que a idéia era atingir o poder econômico dos barões do cacau. Geraldo Simões sugeriu que a vassoura-de-bruxa fosse trazida do Norte do país, onde a praga era – e ainda é – endêmica. Franco Timóteo, que já morara no Pará em 1976, foi escolhido para transportar os ramos infectados. "Então eu disse: 'Olha, eu conheço, sei como pegar a praga, mas tem um controle grande nas divisas dos estados'." Era fim de 1987, início de 1988. Apesar do risco de ser descoberto no caminho, Franco Timóteo foi escalado para fazer uma primeira viagem até Porto Velho, em Rondônia. Foi de ônibus, a partir de Ilhéus. "Em Rondônia, qualquer fazenda tem vassoura-de-bruxa. Nessa primeira viagem, peguei uns quarenta, cinqüenta ramos. Coloquei num saco plástico e botei no bagageiro do ônibus. Se alguém pegasse, eu abandonava tudo." Nos quatro anos seguintes, repetiria a viagem sete ou oito vezes, com intervalos de quatro a seis meses entre uma e outra. "Mas nas outras viagens trouxe os ramos infectados num saco de arroz umedecido. Era melhor. Nunca me pegaram."

Franco Timóteo conta que, quando voltava para Itabuna, entregava o material ao pessoal encarregado de distribuir a praga pelas plantações. A primeira fazenda escolhida para a operação criminosa chamava-se Conjunto Santana, ficava em Uruçuca e pertencia a Francisco Lima Filho, então presidente local da União Democrática Ruralista (UDR) e partidário da candidatura presidencial de Ronaldo Caiado. Membro de uma tradicional família cacaueira, Chico Lima, como é conhecido, tinha o perfil ideal para os sabotadores: era grande produtor e adversário político. "Chico Lima era questão de honra para nós", diz Franco Timóteo. Foi justamente na fazenda de Chico Lima que foi encontrado o primeiro foco de vassoura-de-bruxa, em 22 de maio de 1989 – e a imagem dos técnicos, no exato momento em que detectam a praga, ficou registrada numa fita de vídeo à qual VEJA teve acesso. Como medida profilática os técnicos decidiram incinerar todos os pés de cacau da fazenda. Chico Lima ficou arruinado. Hoje, arrenda as terras que lhe restam e vive dos lucros de uma distribuidora de bebidas. Informado por VEJA da confissão de Franco Timóteo, ele lembrou que sempre se falou de sabotagem – mas de estrangeiros – e mostrou-se chocado. "Isso é um crime muito grande, rapaz. Os responsáveis têm de pagar", disse.

Os ataques às fazendas, todas situadas ao longo da BR-101, aconteciam sempre nos fins de semana, quando diminui o número de funcionários. O grupo tinha o cuidado de usar um carro com logotipo da Ceplac para criar um álibi: se eles fossem descobertos por alguém, diriam que estavam fazendo um trabalho de campo. "A gente chegava, entrava, amarrava o ramo infectado no pé de cacau e ia embora. O vento se encarregava do resto", conta Franco Timóteo. Para dar mais verossimilhança a uma suposta disseminação natural da vassoura-de-bruxa, o grupo tentou infectar pés de cacau numa lavoura mantida pela própria Ceplac. Não deu certo, devido à presença de um vigia, e o grupo acabou esquecendo, no atropelo da fuga, um saco com ramos infectados sobre a mesa do escritório da Ceplac. A operação criminosa, por eles apelidada de "Cruzeiro do Sul", desenrolou-se por menos de quatro anos – de 1989 a 1992. "No início de 1992, parou. Geraldo Simões disse que a praga estava se propagando de forma assustadora. Não precisava mais."
Os sabotadores nunca foram pegos, mas deixaram muitas pistas. "Encontramos provas de que houve sabotagem em várias fazendas", conta Carlos Viana, que trabalhava como diretor da Ceplac quando a praga começou a se disseminar. Ele se lembra do saco plástico esquecido sobre a mesa do escritório da Ceplac numa das lavouras – e isso o levou, inclusive, a acionar a Polícia Federal para investigar a hipótese de sabotagem. "Uma coisa eu posso garantir: os focos não foram acidentais", diz Viana, que deixou o órgão e tem hoje uma indústria de óleo vegetal. Um relatório técnico e oficial, elaborado pela Ceplac logo no início das investigações, chegou a considerar a hipótese de que produtores do Norte do país teriam levado a vassoura-de-bruxa para as plantações da Bahia – mas movidos por "curiosidade ou ignorância". O relatório afirma que a chegada à Bahia da Crinipellis perniciosa, nome científico do fungo causador da vassoura-de-bruxa, "não pode ser atribuída a agentes naturais de disseminação". VEJA consultou Lucília Marcelino, pesquisadora da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, em Brasília, para saber se a história contada por Franco Timóteo seria viável. "Sob o ponto de vista técnico, sim", diz ela.

A sabotagem produziu um desastre econômico. Derrubou a produção nacional para menos da metade, desempregou cerca de 200.000 trabalhadores e fez com que o Brasil, então o segundo maior produtor mundial de cacau, virasse importador da fruta. Um estudo da Universidade Estadual de Campinas, elaborado em 2002, estima que a devastação do cacau na Bahia provocou, nos últimos quinze anos, um prejuízo que pode chegar à astronômica cifra de 10 bilhões de dólares. Mas, na mesquinharia política dos sabotadores, o plano foi um sucesso. Em 1992, no primeiro pleito depois da devastação, Geraldo Simões elegeu-se prefeito de Itabuna pelo PT – e presenteou os quatro companheiros de sabotagem com cargos em sua gestão. Everaldo Anunciação foi nomeado secretário da Agricultura – cargo que deixaria dois anos depois, sendo substituído por Jonas Nascimento, o outro petista sabotador. Wellington Duarte, também membro do grupo da sabotagem, ficou como chefe-de-gabinete do prefeito. E Eliezer Correia ganhou o cargo de secretário de Administração e Finanças. Como não pertencia ao PT, Franco Timóteo não ganhou cargo algum na prefeitura. Em 1994, com o recrudescimento de suspeitas de que a vassoura-de-bruxa fora uma sabotagem, ele resolveu deixar Itabuna e mudar-se para Rondônia. O prefeito lhe deu um cheque de 250.000 cruzeiros reais (o equivalente a 800 reais hoje) para ajudar nas despesas da viagem – paga, para variar, com dinheiro público. A operação consta da contabilidade da prefeitura, em que está registrada sob o número 2 467, e informa que o beneficiário era mesmo Franco Timóteo, mas, providencialmente, não há processo descrevendo o motivo do pagamento. "É estranho. Se havia algum processo, sumiu", diz o atual prefeito, Fernando Gomes, do PFL.

Nos últimos anos, Franco Timóteo tem sido assaltado pelo remorso do crime que cometeu. Um dos atingidos era seu parente. Silvano Franco Pinheiro, seu primo, tinha uma empresa de exportação de semente de cacau que chegou a faturar 30 milhões de dólares por ano. "Perdi tudo", conta Pinheiro, que, há seis anos, ouviu a confissão de Franco Timóteo. "Falei para ele sumir da cidade porque seria morto", conta o primo. Para expiar sua culpa, Franco Timóteo também fez sua confissão para outro fazendeiro, Ozéas Gomes, que chegou a produzir 80.000 arrobas de cacau e empregar 1.400 funcionários – e hoje mantém ainda um padrão confortável de vida, mas emprega apenas 100 funcionários, A produção caiu para 15.000 arrobas. "Quando ouvi a história, fiquei com muita raiva. Mas, depois, ele explicou que não tinha idéia da dimensão do que fazia..." No fim do ano passado, Franco Timóteo confessou-se ao senador César Borges, do PFL baiano e plantador de cacau. "A história dele tem muitos pontos de veracidade diante do que a gente sempre suspeitou ter acontecido", diz o senador. O governador Paulo Souto, cujos familiares perderam tudo devido à vassoura-de-bruxa, também ouviu uma confissão de Franco Timóteo. O senador e o governador, porém, decidiram ficar em silêncio, segundo eles para evitar a acusação de exploração política.

Os acusados desmentem categoricamente qualquer envolvimento na sabotagem e dizem até que nem sequer conhecem Franco Timóteo. "Nunca vi esse louco", diz Geraldo Simões, que, no governo Lula, ganhou a presidência da Companhia das Docas da Bahia, da qual se afastou agora para concorrer a deputado federal pelo PT. "Essa história toda é fantasiosa", diz Eliezer Correia, que continua cuidando de cacau e hoje é chefe de planejamento da Ceplac, em Itabuna. "É um absurdo", diz Wellington Duarte, que, no atual governo, foi promovido a um dos chefões da Ceplac em Brasília. Everaldo Anunciação, que foi nomeado para o cargo de vice-diretor da Ceplac, diz que não liga o nome à pessoa. Jonas Nascimento – demitido a bem do serviço público na década de 90, voltou numa função comissionada, em 2003, no Centro de Extensão da Ceplac em Itabuna – é o único que admite conhecer Franco Timóteo, mas nega a história. Talvez seja o único a contar um pedaço da verdade. Ouvido por VEJA, o publicitário Ithamar Reis Duarte, ex-secretário de Meio Ambiente na gestão do petista Geraldo Simões, conta que essa turma toda – Franco Timóteo e os petistas – é de velhos conhecidos. "Era um grupo que se reunia sempre para planejar ações", diz ele, que participou de alguns encontros. "Fazíamos reuniões até no meu escritório. Se alguém negar isso, estará mentindo."

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